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“Novos caminhos devem ser procurados”
Hisashi Noguchi: Diretor da Divisão de Política de Empregos de Empregos para Estrangeiros no Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar Social
 

Hisashi Noguchi: agora, japoneses e estrangeiros disputam as mesmas vagas

(Reportagem e Foto: Nelson Watanabe)

Nos últimos 25 anos, a força de trabalho dos brasileiros foi de grande importância para as empresas japonesas, sobretudo as indústrias automobilísticas e, consequentemente, para o próprio crescimento da economia do país nestas duas décadas e meia. A opinião é de Hisashi Noguchi, diretor da Divisão de Política de Empregos de Empregos para Estrangeiros no Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar Social.

Ele explica que, com a crise, no entanto, as montadoras, que continuavam absorvendo a maior parte da mão de obra nikkei, foram uma das mais afetadas, levando a dispensas em massa num curto período. Até então, a grande maioria dos trabalhadores vivia sob o guarda-chuva das empreiteiras. Eram elas que providenciavam desde a busca pela vaga até a moradia.

Em sua opinião, depois da crise, em 2008, os tempos são outros. Empreiteiras fecharam as portas e os trabalhadores tiveram de se virar por conta própria em busca de uma vaga no mercado. No entanto, eles puderam enxergar uma nova perspectiva. O tipo de serviço não se limitava apenas ao chão de fábrica. Tinham à disposição vários cursos técnicos de capacitação com os quais poderiam ter a chance de dar um passo à frente.

Em sua palestra no Simpósio Internacional “25 Anos do Fenômeno Decasségui”, promovido pelo Ciate, em novembro de 2010, Noguchi fez um apanhado da situação econômica japonesa, do mercado de trabalho e as perspectivas para os trabalhadores nikkeis. (Nelson Watanabe/NB)

 
Entrevista

Antes de 2008, as Hello Work recebiam cerca de 600 pessoas por mês. Após a crise, esse número subiu para quase 5 mil atendimentos mensais

A falta de um vínculo mais forte entre empresa e funcionário, em geral exercendo serviço temporário, pode estar prejudicando a qualidade dos produtos japoneses, o que explicaria o alto número de recalls das fábricas nipônicas mundo afora

Situação do mercado de trabalho
O desemprego no país permanece na casa dos 5%. Esse número está melhorando, mas, para a realidade japonesa, ainda é muito alto. Significa que há cerca de 3,29 milhões de desempregados no Japão. Esse total só não é maior pelo seguinte fato: a empresa que está em dificuldades gostaria de demitir. Mas o próprio funcionário faz um apelo para ficar, mesmo com a redução do salário. Este tipo de caso tem aumentado bastante. Além disso, o próprio governo tem oferecido subsídios para que as empresas não dispensem. São com medidas emergenciais que o país tem conseguido segurar o índice de desemprego. O número de pessoas subsidiadas é de cerca de 1,21 milhão. Se não houvesse essa ajuda, essas pessoas também estariam desempregadas. A situação, como se vê, ainda é difícil.

Tendência da taxa de emprego
De acordo com pesquisas, hoje, para cada cem pessoas que procuram emprego, 55 conseguem uma vaga, mas outras 45, não. Esse índice vem se mantendo, mas a grande preocupação é com a situação econômica. Em outubro de 2010, dados indicavam que a economia japonesa estava estagnada. Ou seja, o desemprego se mantém e a economia continua sem crescimento. Há várias avaliações sobre a situação do país. Uns indicam melhora e outros, piora. Mas entendo que o que tem afetado mesmo é a alta do iene e a queda da produção. Portanto, ainda não podemos nos tranquilizar.

Cenário do mercado após a crise
A situação é bastante diferente antes e depois da crise. A maioria trabalhava por empreitada e muitos perderam o emprego. As empreiteiras também sentiram o reflexo e fecharam as portas. Os trabalhadores demitidos que moravam em apartamentos alugados pelas empreiteiras, com o fechamento delas, além de ficarem sem emprego, também ficaram sem lugar para morar. Eles não estavam sozinhos, mas com as famílias, e passaram a viver uma situação triste e difícil. De acordo com os dados das Hello Work (Agência Pública de Emprego), antes de 2008 eram feitos entre 600 a 700 atendimentos por mês. De janeiro a março de 2009, esse número subiu para 5 mil mensais, quase dez vezes mais, e a maioria é de brasileiros. Essa procura diminuiu um pouco com o passar do tempo, mas se estagnou num patamar alto. Isso significa que as pessoas muitas e muitas vezes estão retornando para consultas de vagas, mas não conseguem um emprego.

Em setembro de 2010, cerca de 10 milhões de trabalhadores estavam na área de produção. Parte das vagas foram recuperadas, mas no setor de manufatura existe um grande número de trabalhos sazonais, com contratos de três meses e até de um mês. Esse tipo de trabalho tem aumentado muito. Houve uma certa recuperação nesse área, mas a pergunta é: será que o emprego é estável?

Situação dos nikkeis
A situação está difícil e ela é igual para japoneses e estrangeiros residentes no Japão. O primeiro-ministro Naoto Kan tem dito que a prioridade é o emprego, mas não adianta apenas falar – é preciso tomar medidas concretas.

Aqueles que acabaram de se formar nas universidade não conseguem colocação e, para o Japão, isso é um problema muito sério. Com relação aos nik-keis brasileiros, eles estão enfrentando problemas mais sérios que os formandos. De maneira sucinta, isso se deve a:

1. Falta de conhecimento da língua japonesa
Até agora, as empreiteiras tomavam conta de tudo. Os contratados não precisavam fazer quase nada. Agora, na medida em que caiu essa proteção, cada trabalhador precisa tomar todas as providências para conseguir uma vaga. Nas Hello Work, precisam explicar onde pretendem trabalhar, preencher formulários e, ainda, passar por entrevista com o empregador. É um procedimento comum para qualquer trabalhador, mas até antes da crise, a maioria dos brasileiros não se preocupava com isso. Mas agora, como eles próprios têm de buscar o emprego, sentem no idioma a primeira dificuldade. Nos formulários, não se pode escrever em português porque o empregador não vai entender. É preciso usar o japonês. Não é necessário ter o japonês perfeito, mas precisa, pelo menos, escrever em katakana ou hiragana. Sem isso, o empregador nem vai se dar ao trabalho de convocar o candidato para conversar. E é justamente na entrevista que a pessoa tem a chance de mostrar sua capacidade.

2. Os nikkeis e os japoneses começam a disputar os mesmos cargos
Muitos nikkeis já estão estabelecidos no Japão com casa, carro e, claro, é preciso dinheiro para manter tudo isso. Para tanto, o salário precisa ser condizente para suas necessidades de vida. Ou seja, os nikkeis também estão em buscas de trabalho com bom nível de salário. Mas é um nível em que o próprio japonês gostaria de ser admitido. Sendo assim, mesmo que seja no chão de fábrica, o japonês encararia o trabalho. Então, cabe ao empregador escolher entre um estrangeiro e um nativo. A opção será pelo japonês e não por questão de preconceito ou de discriminação. O fato é que um sabe japonês e outro não.

Situação futura
Em junho deste ano, por meio de uma Hello Work, fizemos uma pesquisa sobre o que os estrangeiros pensavam. Dos 3.800 que responderam ao questionário, 60% (2.400) eram brasileiros e peruanos. Perguntamos sobre as perspectivas de futuro. A maioria (43%) marcou o item “Espero que a situação econômica melhore, mas se eu não falar japonês não conseguirei emprego”. O que nos surpreendeu foi que 17% assinalaram que “A situação econômica vai melhorar e eu poderei trabalhar como antigamente”. Para estas pessoas, a expectativa é de que basta a situação melhorar para conseguir de volta o emprego. O preocupante é que não levam em consideração o fato de não dominarem o idioma japonês. Não estou dizendo se esse tipo de pensamento é certo ou errado. Só saberemos a resposta no futuro. Mas acredito que essas pessoas têm um pensamento um tanto quanto perigoso.

Em uma outra pesquisa feita pelo Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar Social com empresas localizadas em áreas de grande concentração de estrangeiros (cerca de 20 mil localidades) um ponto nos alegrou. Das 2.300 companhias que responderam, dois terços fizeram uma avaliação positiva sobre os trabalhadores estrangeiros. Só que, desculpe ficar insistindo, 80% das empresas informaram que no momento de empregar os estrangeiros vão exigir o conhecimento do idioma japonês como prioridade.

Em outra pesquisa feita com os brasileiros nikkeis, só 43 pessoas responderam. Não sei se isso reflete alguma realidade. A média de idade era de 42 anos, portanto em pleno vigor físico, com tempo médio de 14 anos no Japão e de 13 anos de trabalho no país. Com relação ao conhecimento do idioma, 60% disseram conseguir falar no local de trabalho; 30% conseguiam ler o manual de trabalho e 20% eram capazes de escrever relatórios.

Metade deles trabalhava em empreiteiras e agora faz arubaito (bico) ou trabalha em tempo parcial e um terço estava em emprego direto. Dá para enxergar que estão deixando as empreiteiras para o emprego direto. Com relação à seguridade social, mais de 40% não pagavam o hoken. No momento, está sendo discutido pela Dieta uma reforma na lei de empreitada (haken). Essas empresas vinham atuando graças ao afrouxamento da legislação e isso fez com que o emprego se tornasse muito instável. O intuito é fazer que a posição do trabalhador seja mais forte. No pano de fundo está a melhoria no controle de qualidade dos produtos japoneses. No passado, os “Made in Japan” eram muito conhecidos como sinônimo de qualidade. Hoje temos diversos problema, como se vê pelos recalls. Isso (os recalls) talvez esteja acontecendo porque não se relevou a importância da mão de obra, do homem, dos recursos humanos. As empresas estão repensando essa questão. Quando se emprega um trabalhador via empreiteira existe uma relação indireta e isso faz que, às vezes, não haja o recurso humano que se quer. Por isso, hoje a tendência é valorizar o emprego direto e a pessoa contratada. Contratar mão de obra por meio das empreiteiras provavelmente vai se tornar mais difícil.

O que o governo precisa fazer
A situação do emprego no Japão continua severa. Em 2009 lançamos medidas emergenciais para fazer face a esta questão séria da situação econômica. Continuamos em 2010 com esse trabalho. Conseguimos superar o pico do desemprego, mas o problema não acabou. Não podemos afrouxar as rédeas.

As Hello Work devem melhorar o atendimento e, para isso, vamos constituir uma estrutura para atender os estrangeiros. Vamos buscar intérpretes que sejam consultores para apresentarem os locais de emprego e tentar diminuir essa fila.

Em uma outra frente, vamos oferecer cursos de capacitação. Mas o alicerce seria o ensino da língua japonesa. Não se trata de uma escola de ensino normal, mas do ensino do japonês prático como, por exemplo, como escrever um currículo, como enfrentar uma entrevista. Ou seja, um curso de japonês para o trabalho. Não tínhamos muito know how para isso e pedidos a contribuição de uma divisão da Jica. Cerca de 6 mil pessoas já frequentaram os curso de japonês oferecidos por meio do Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar Social e, dos que terminaram, 35% conseguiram uma vaga. Gostaríamos que mais pessoas fizessem esse curso, que é gratuito. O fato lamentável é que dos 2.608 brasileiros que começaram as aulas, 14% desistiram sem qualquer explicação. Talvez porque começaram um trabalho temporário ou devido a uma circunstância inevitável. Mas, mesmo assim, poderiam frequentar o curso em horários alternativos, como fins de semana ou à noite, que estamos colocando à disposição. Estamos até reduzindo o tempo do curso de quatro para três semanas. O nível de conhecimento de japonês sem dúvida aumenta as habilidades.

No total, oferecemos 43 tipos de cursos de treinamento técnico e de habilitação. Seria interessante pelo menos a pessoa ir até uma dessas escolas e ver que tipo de treinamento está sendo dado.

É importante observar as tendências no Japão. O país, por exemplo, tem uma população envelhecida e muitas casas que cuidam dessas pessoas estão à procura de mão de obra. Quem fizer um curso de cuidador de idosos, por exemplo, teria uma boa alternativa de trabalho. Acho que os brasileiros têm uma grande facilidade de comunicação, de contato pessoal, de carinho com pessoas. Então, acredito que novos caminhos devem ser procurados.

De um modo geral, os brasileiros não participam do sistema de seguridade social. Mas desde junho o governo vem fazendo uma verificação rigorosa para renovar a licença de funcionamento das empreiteiras. Está checando minuciosamente se a mão de obra contratada está inscrita no sistema de seguridade social. Se não estiver, a licença não vai ser renovada. É preciso entender que esta medida é para a própria proteção do trabalhador e é benéfica, ainda mais agora com o acordo previdenciário Brasil-Japão.

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