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Caderno Budismo

Não adianta contar a fortuna de outros...
nem um centavo do outro lhe pertence!
“Ehrr... isso amarra a boca!”, disse o garoto que comia um caqui descascado pela mãe.
“Ah, é... está ruim? Então, vou lhe dar este outro...”, respondeu a mãe, carinhosamente, começando a descascar outro caqui de aparência mais madura.
Foto: Divulgação

Numa situação como a descrita acima, se pararmos para refletir um pouco, caso o caqui não esteja a gosto, devemos dar em troca um outro?

Há muito tempo, num templo que ficava nas montanhas, vivia um bonzo que adorava tofu (queijo de soja), e todos os dias pedia a seu jovem discípulo para comprar o alimento. Entretanto, havia um velhote sovina que todos os dias ficava à espera em frente ao portão e, sempre que o noviço tentava sair, o velhote abria seus longos braços e impedia sua passagem, perguntando: “Ei moleque, onde vai?”. A situação repetiu-se por dias, e o noviço já estava irritado com o velhote, quando resolveu contar ao bonzo e pedir conselho sobre como dar uma lição no velhote sovina. O mestre, então, pensou e aconselhou: “Da próxima vez em que ele lhe importunar, responda: ‘Vou para o paraíso!”.

Na manhã seguinte, o noviço saiu todo confiante imaginando que, finalmente, ia passar a perna no velhote. Como sempre, o avarento o esperava e, com os braços, abertos perguntou: “Ei, moleque... onde vai?”, e o noviço, sem hesitar e com o rosto radiante, respondeu: “Hoje vou para um lugar diferente... vou tomar a direção oeste!”. O velhote surpreendeu-se por um momento, mas continuou: “O quê? Para a direção oeste, é!? Humm, você andou recebendo orientações do velho bonzo, não é...!? E que lugar a oeste?”, continuou. O noviço, todo confiante, peitou o velhote e gritou: “O Paraíso!”. Entretanto, o velhote era macaco velho e continuou perguntando: “Vai lá fazer o quê!?”. E o noviço se desesperou, pois não havia perguntado ao seu mestre a continuação. Enquanto isso, o velhote rabugento continuava pressionando insistentemente: “Quero saber, fale, fale, fale! Se responder, então deixo você ir ao Paraíso”. Mas o noviço não tinha argumentos para dar continuidade à sua prosa.

Aquilo que tomamos emprestado nunca se torna algo nosso, pois o que é emprestado sempre será algo emprestado. Para conhecer a sensação de quente ou frio, é preciso experimentar a sensação para que se torne algo realmente vivenciado. Não há conhecimento sem dedicação e esforço. Sem isto, não há amadurecimento.

Deseperado, o noviço respondeu: “Só quero ir comprar tofu!”, e pôs-se a choramingar.

Não adianta ficar contando as moedas do mendigo, o que você ganha com isso? Nem sequer um centavo... Não adianta ter ouvido um monte de teorias, se elas não se tornam uma experiência sua. A questão não termina na tentativa fracassada do noviço, pois mais que o erro do jovem noviço, maior é o erro do bonzo, que simplesmente deu ao noviço um caqui mais doce e maduro quando o rapaz reclamou que estava amarrando a boca. Por que o bonzo não ensinou ao noviço como fazer para tirar a adstringência do caqui e deixá-lo doce?

Geralmente, costumamos ouvir ou ler experiências e histórias alheias e nos iludimos achando que adquirimos o conhecimento e a experiência através deles. Entretanto, aquilo que adquirimos com dedicação e esforço se incorpora à nossa vida, não pode ser tirado de nós por nada ou ninguém e nos servirá pelo resto de nossas vidas. Só se faz por merecer aquilo que batalhamos para conseguir, e é por esse motivo que nossa prática se faz necessária em todos os momentos. Não basta um conhecimento superficial ou apenas teórico; enquanto não vivenciarmos uma experiência, ela não será realmente nossa.


Créditos:
O texto é uma compilação da coletânea de Shunmyo Sato, comentado por seu discípulo, bispo Dosho Saikawa, superintendente da Sotoshu na América do Sul e abade da Comunidade Budista Soto Zenshu da América do Sul, Templo Busshinji. Tradução de Cristina Izumi Sagara.
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