Opinião
- Edição 585 -
Jornal NippoBrasil
Balança comercial
Teruo Monobe*
Duas
notícias, uma boa e outra má. Primeiro a boa: a balança
comercial agrícola chegou ao superávit de US$63 bilhões,
com exportação total de US$76,4 bilhões. A má
notícia: a balança industrial teve déficit de US$37
bilhões. A partir dessas duas notícias, decorre uma série
de outras boas e más, que passaremos a comentar a seguir. O leitor
pode se entreter dividindo as boas e as más notícias deste
artigo, como se fosse um jogo de bem-me-quer e mal-me-quer.
A importação
de produtos industriais aumentou 40%, enquanto as exportações
só cresceram 23,5%. Duro é constatar que boa parte das exportações
foi de mercadorias produzidas com componentes ou matérias-primas
importadas. Por outro lado, outra má notícia é que
apenas cinco commodities (minério de ferro, petróleo bruto,
soja, açúcar e complexo carnes) concentram 43% das exportações
do Brasil. Outro dado é que a China está se tornando o fiel
da balança, tanto como compradora de commodities quanto exportadora
de produtos industriais.
Se de um lado
a questão da elevação das importações
descamba para a desindustrialização, por outro lado, fala-se
em primarização da pauta comercial. Primarização
quer dizer exportação em produtos primários. Piores
são outros fatores, como o custo Brasil e a valorização
do real, ambos tirando a competitividade dos manufaturados brasileiros.
Da mesma forma, o excesso de encargos sobre a folha de pagamento das empresas
aumenta o custo de mão-de-obra. Assim, a China faz a festa em mercados
onde o Brasil tenta atuar.
Seria desnecessário
mencionar quão perigosa é a concentração de
exportações. A lógica prega que produtos com maior
tecnologia requerem trabalhadores mais bem preparados. Não é
o caso do Brasil, cujo problema é ser pouco competitivo em produtos
com tecnologia e concentrar a exportação em poucas commodities.
Depender de commodities é perigoso, já que a demanda depende
muito do crescimento da China ou da recuperação dos Estados
Unidos. Outro problema é que os preços das commodities são
muito voláteis.
Recentemente,
noticiou-se que a Índia começou a avançar nas matérias-primas
brasileiras. As vendas de produtos básicos para aquele país
saíram de US$370 milhões para US$1,74 bilhão em pouco
tempo, principalmente de petróleo e açúcar. O risco
é que, como a China, o Brasil passe a importar manufaturados dos
indianos, para compensar as commodities vendidas para eles. Ao contrário
da China, o mercado indiano é cheio de barreiras tarifárias
à comercialização de produtos do setor agrícola,
sendo as tarifas médias de importação de 65%.
Se o mercado
de produtos agrícolas está conturbado, a proposta da França
de estoque global começa a ser detonada, tanto pelos Estados Unidos,
quanto pelo Brasil. Na realidade, a idéia francesa é usar
o G-20 para regular os preços de produtos agrícolas e criar
um estoque mundial de alimentos. Não poderia ser de outra forma:
a proposta foi duramente atacada e o governo francês foi acusado
de manipular a crise alimentar para defender seus interesses protecionistas.
Não deve estar muito longe da realidade.
A proposta
do presidente Sarkozy, que inclui intervir em preço e volatilidade
dos mercados, faz sentido. A questão é que do outro lado
estavam os Estados Unidos e o Brasil, dois dos maiores produtores de commodities
do mundo. A ideia francesa é criar uma espécie de Conab
Mundial, mas acabou sendo vista como uma tentativa de intervenção
no mercado. De acordo com negociadores brasileiros, apesar de legítima,
intervenção como essa traria mais distorção
ao mercado agrícola, e alguns países poderiam se valer para
praticar o protecionismo.
Faz bem o Brasil
tentar defender sua posição e ao mesmo tempo negociar uma
solução para os países pobres não sofrerem
tanto com a crise agrícola. A sugestão brasileira passa
pela criação de incentivos para a formação
de estoques nos países pobres e até a venda de produtos
a preços mais baixos. E, no âmbito do G-20, um limite à
especulação com produtos agrícolas. Isso vale para
a Europa, já que Brasil e Estados Unidos já dispõem
de bolsas de commodities muito fortes. Como se pode ver, está cada
vez mais difícil chegar a um consenso global.
*Mestre em Administração Internacional e doutor pela USP
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