Conversando
com Abe-san, de Presidente Prudente, simpática figura que
conheci outro dia, discorríamos sobre um tema recorrente,
ao menos para mim: a velhice. Percebi que também para
ele o assunto causava preocupação. E não estávamos
falando de uma possível crise existencial, ou de uma crise
da terceira idade. O tema não era sobre esse prisma. Estávamos
comentando sobre a preocupação que temos ou devemos
ter com os nossos velhinhos, os nossos pais. Da nossa geração
à atual, o tempo fez o favor de provocar mudanças
radicais na forma de encarar o assunto.
Isso
me fez lembrar um filme ao qual assisti há muito tempo: A
Balada de Narayama, de Shohei Imamura, premiado em Cannes com a
Palma de Ouro. Esse filme retrata, no fim do século XIX,
uma tradição que ocorria em um pequeno vilarejo japonês,
onde o morador que completasse 70 anos de idade era praticamente
eliminado da comunidade, devendo subir ao topo de uma sagrada montanha
e aguardar a sua morte. Aquele que se recusasse a cumprir o costume
trazia a desonra para a sua família.
Esse
é um exemplo extremo de como a velhice era encarada. Ainda
se prendendo aos costumes que ocorrem na comunidade nipônica,
até hoje, é comum deparar, em certas famílias,
com o compromisso que tem o filho mais velho de assumir as responsabilidades
da casa, inclusive a de cuidar dos pais já idosos. Quando
o "tionam", ou seja, o primogênito, não assumia
essa obrigação, muitas vezes, os pais tinham que ser
encaminhados a algum asilo, dos poucos que existem até hoje.
Esses asilos, infelizmente, não oferecem o conforto de um
lar, na maioria dos casos.
Atualmente,
não podemos imputar aos nossos filhos essa responsabilidade.
O mundo mudou muito. Assim como mudaram as relações
familiares; muitos filhos, mesmo jovens, já adquiriram certa
independência e deixaram a casa dos pais. E isso se aplica
às mulheres; mesmo solteiras, algumas vão buscar o
seu espaço lá fora, rompendo o laço umbilical,
coisa impensável tempos atrás.
O surgimento
do conceito da terceira idade, ocorrido há quatro
décadas, por força da nova realidade demográfica
do Brasil, provocou uma alteração positiva na imagem
do idoso, até então um excluído social. Pesquisas
mostram que os espaços estão sendo criados e ocupados
rapidamente pela população de meia idade, para que
novas experiências de envelhecimento possam ser vividas coletivamente.
Exemplos disso são a criação de instituições
como a universidade da terceira idade, os spas, os grupos de dança
de salão, as viagens turísticas, os grupos recreativos,
as academias de Educação Física, ioga, pilates
e de hidroginástica, e os espaços de saúde
e beleza, que já se encontram no mercado para atender a esse
público específico, que está cada vez maior.
Uma boa
notícia para os nossos filhos, para os jovens da geração
"internet", é o surgimento da implantação
de projetos de Co-housing, condomínios residenciais
compartilhados, voltados para a terceira idade, como já existem
na Europa, no Canadá e nos EUA, onde a convivência
social e a qualidade de vida são prioridades. Nesses locais,
os pais poderão curtir a tão aguardada aposentadoria,
naquele lugar tão sonhado, em meio às flores, ao verde,
junto a um pomar, a uma horta, pescando, jogando tênis, gateball,
dançando, lendo, contando com profissionais residentes, como
cuidadoras, enfermeiras, serviços de limpeza, restaurante,
lavanderia... e usufruindo do que eles têm de melhor e mais
saudável: o desejo de viver com independência e autonomia.
Tudo isso está dentro do conceito que baliza as novas políticas
e os negócios voltados para a terceira idade, que tem como
principal objetivo fazer com que as pessoas consigam permanecer
em casa, ou em uma comunidade, sem que, para isso, precisem de um
familiar por perto. Os idosos de hoje preferem, na realidade, morar
sozinhos, mantendo-se donos de seu próprio nariz.
Do idoso
de Narayama aos dias atuais, envelhecer passou a ser uma benção,
e não uma doença, ou um problema.
Katsuo Higuchi
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