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Hattori Ransetsu (16541707) |
futon
kite
netaru sugata ya
higashi yama
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Tradução:
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Sob o futon
Alguém está dormindo
Montanhas do Leste.
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Entardece em Quioto. A leste do Rio Kamo, os vales e montanhas estendem-se
em direção ao horizonte. Os contornos arredondados e suaves
da paisagem lembram a imagem familiar de alguém que dorme, mas
de quem só se delineia a silhueta, por estar coberto por um futon
(espécie de edredom), peça indispensável ao sono
japonês.
A comparação extremamente coloquial de uma paisagem da
natureza com a realidade do cotidiano, inclusive com o empréstimo
de um item doméstico, é adequada e divertida e fez a fama
deste haicai. Por outro lado, uma interpretação não
metafórica, a de que existe realmente uma pessoa dormindo sob um
futon aos olhos do poeta, em composição com a paisagem das
montanhas, parece não se sustentar, de acordo com vários
comentadores.
O kigo (termo de estação) é futon (edredom, acolchoado
japonês), tradicionalmente associado ao inverno. Ainda que utilizado
no sentido metafórico, não existindo na realidade, seu emprego
sugere claramente a visão das Montanhas do Leste no inverno.
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Hattori Ransetsu (16541707) |
ume
ichirin
ichirin hodo no
atatakasa
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Tradução:
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Ameixeira em flor
De botão em botão
Os dias esquentam.
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É inverno, mas uma ameixeira floresce. Para o autor, é
muito clara a percepção de que, dia após dia, é
como se cada nova flor que desabrocha fizesse o frio recuar um pouco,
abrindo espaço para a primavera que se aproxima.
Normalmente, ameixeira (ume) seria um kigo (termo de estação)
de primavera, mas, na epígrafe a esse haicai, Ransetsu esclareceu
tratar-se de uma ameixeira de inverno (kanbai), com a floração
adiantada, vindo daí a classificação destes versos
na estação fria.
A palavra atatakasa, por outro lado, significa aproximadamente esquentar,
não na acepção de calor de verão, mas como
sinônimo da transição do desconforto do frio do inverno
para uma situação de temperatura agradável.
Estes versos podem ser criticados por serem algo explicativos e raciocinantes,
mas tornaram-se muito famosos ao expor os misteriosos mecanismos que conectam
as forças vitais da natureza. O haicai, em sua forma original,
tem 6-7-5 sílabas.
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Hattori Ransetsu (16541707) |
umazume
no
hina kashizuku zo
aware naru
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Tradução:
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É pungente ver
Como cuida das bonecas
A mulher sem filhos.
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Uma vez por ano, as famílias que possuem filhas pequenas montam,
em suas casas, plataformas de até sete degraus onde dispõem
coleções de bonecas representando a família imperial
e sua corte. Tais bonecas têm o nome de hina ningyô e podem
ser muito luxuosas, dependendo das posses de cada lar.
Até a Era Edo, a comemoração tinha seu ápice
no terceiro dia do terceiro mês do calendário lunar. Esse
dia recebia o nome de hina matsuri (festival das bonecas, também
conhecido por dia das meninas). Modernamente, a data é comemorada
em 3 de março. Nesse dia, reza-se pela saúde e a prosperidade
das meninas. As bonecas são expostas desde o mês anterior,
mas uma superstição diz que elas devem ser guardadas imediatamente
após o festival, ou as filhas da casa não encontrarão
casamento.
O haicai baseia-se, provavelmente, na esposa do próprio autor,
que não teve filhos, e mostra sua figura esmerando-se em cuidados
com as bonecas, atitude que despertou a compaixão de Ransetsu.
O kigo é hina (boneca específica do festival das bonecas)
e a estação é primavera.
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Hattori Ransetsu (16541707) |
ganjitsu
ya
harete suzume no
monogatari
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Tradução:
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Sob o céu azul
A conversa dos pardais
Dia de ano novo.
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Especialmente na Era Edo, a última noite do ano representava o
momento de acerto de contas com a vida, numa dimensão difícil
de imaginar nos dias de hoje, tanto quanto o peculiar sentimento de alívio
e revigoramento por ultrapassar essas horas e chegar à manhã
do primeiro dia do ano.
Os bons augúrios vêm na figura de pardais trinando em bando
sobre os beirais das casas, sob uma límpida manhã, como
se conversassem. Na verdade, homens e pardais parecem tomados pela mesma
atmosfera de renovação. Até mesmo a personificação
(conversa) atribuída aos pássaros é bem
adequada, ao chamar a atenção para o aspecto gracioso de
seres que normalmente passam despercebidos. Quando afirma que pardais
conversam, o autor também deixa entrever um pouco da criança
que vive em sua alma.
Ransetsu foi samurai antes de tornar-se um dos mais representativos discípulos
de Bashô. Ao contrário do gênio expansivo de Kikaku,
foi um homem gentil e moderado. O kigo é ganjitsu (dia de ano-novo
ou primeiro dia do ano) e a estação é primavera.
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