No
final do ano passado, no dia 10 de novembro, a dedicação
de Izumi Yamagata às crianças deficientes foi reconhecida
pelo município com a outorga do título de Cidadão
Paulistano pela Câmara Municipal de São Paulo. Mas,
mesmo com a homenagem, a voluntária japonesa de 80 anos,
54 deles vividos no Brasil, não deixou de lado a humildade
e, para todos que a parabenizavam, dizia: Ainda não
sei porque me escolheram. São tantas pessoas que ajudam
a instituição...
Mas
não são todas as pessoas que têm uma história
como a de Izumi Yamagata. Nascida no Japão em 1923, a então
jovem senhora de 26 anos chegou ao Brasil com seu marido. Em 1963,
foi uma das quatro fundadoras da Casa da Esperança Kibo
No Iê, uma das principais instituições da
comunidade e que trata de crianças com deficiência
mental. Durante 40 anos se dedicou aos internos, sempre como diretora,
cargo que deixou somente em 2000.
Em
1985, conheceu os benefícios da musicoterapia e os implantou
na entidade, tornando-se uma das pioneiras do uso desta terapia
em deficientes.
Como
foi que a sra. iniciou seu trabalho junto ao Kibo No Iê?
Quando vim ao Brasil, fui morar no Rio de Janeiro. Quando
tive o Léo, meu quinto filho ela tem seis filhos
e sete netos - decidi que seria melhor educá-lo conforme
os costumes japoneses, então nos mudamos para São
Paulo. Um dia, quando fui buscar meu filho na escola japonesa,
o professor Munekata, um grande amigo de Koko Ichikawa, a idealizadora
do Kibô no Iê, me perguntou se eu tinha alguns lápis
de cera usados para doar. Fiquei confusa e perguntei qual a utilidade
deles e ele me respondeu que era para os internos de uma casa
para deficientes físicos e mentais. Fui conhecer o trabalho
e decidi ajudá-los.
Como
era o seu trabalho no início da criação da
entidade?
Eu procurava pessoas, conhecidas e amigas, que pudessem fazer
doações para que as crianças tivessem o que
comer. Fiz isso por algum tempo até que Koko Ichikawa me
chamou para ser diretora do Kibô no Iê. Isso foi em
1963 e só deixei o cargo em 2000.
E
como sua família conviveu com seu trabalho na entidade?
Eles ajudaram muito. Meu marido sempre esteve ao meu lado.
Minha filha deixava de sair muitas vezes para ficar me ajudando
a fazer bolachas para as crianças internas. Eles nunca
reclamaram de que sua mãe ficava um pouco ausente devido
ao trabalho no Kibô no Iê. Tenho muito orgulho de
meus filhos e de meu marido.
Como
está a situação do Kibô no Iê
atualmente?
Temos cerca de 80 internos adultos, todos com defi-ciência
mental e uma grande maioria com deficiência física.
Eles vivem na entidade, na maioria dos casos, por toda a vida,
pois a sua reintegração à sociedade é
praticamente impossível. Inicialmente, pelo grau de deficiência
mental. Depois, pela situação dos pais que, além
de não ter estrutura para receber o interno, acabam por
envelhecer e falecer, deixando-o totalmente dependente da entidade.
Já
sentiu tristeza em seu trabalho com as crianças?
Sim. Como foram muitos anos de trabalho, já senti
muito a morte de alguns internos. Sempre que chegava à
instituição e recebia a notícia do falecimento
de algum deles, sentia uma imensa tristeza.
No final de 2003 o trabalho de Izumi foi homenageada e ela
recebeu o título de cidadã paulistana
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Como
a sra. implantou a musicoterapia na entidade?
Na minha juventude, o estudo era muito difícil devido
aos tempos de guerra em que vivia o Japão. Mas mesmo assim
consegui fazer um curso de musicoterapia com o professor Takehiro
Akaboshi, idealizador do método que leva seu nome (leia
mais no quadro ao lado). Apresentei os benefícios da terapia
para Koko Ichikawa e ela gostou muito. Depois disso começamos
a utilizá-la na entidade.
Qual
fato foi mais marcante em todos esses anos?
Já passaram muitas crianças no Kibô no
Iê e eu tenho muito amor por todas elas, mas um caso foi
especial. Uma garota que ficou cega, muda, surda e sem movimentos
em seu corpo devido a um acidente doméstico foi encaminhada
para nós. Durante as aulas de musicoterapia, ela era colocada
ao lado do amplificador para sentir as vibrações
dos sons. Mais tarde, em uma das aulas, notamos que ela estava
acompanhando a música com a língua (movimentando
para cima e para baixo). Choramos de emoção por
ter conseguido sensibilizá-la. Vendo essa menina, nós
tivemos certeza que deveríamos continuar com a terapia.
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Musicoterapia
Método
reabilita corpo e mente
O
chamado método Akaboshi é desenvolvido para promover
a liberação do estresse e o retardamento do envelhecimento
por meio da música. Em termos físicos, tocar um
instrumento pode estimular a utilização de músculos
e articulações pouco movimentados no cotidiano.
São escolhidos instrumentos que estimulem a extremidade
dos dedos, a flexibilidade dos pulsos. Os voluntários usam
imagens contidas nas letras e melodias das músicas para
promover movimento corporal.
Já
com a prática da respiração abdominal e torácica
na preparação para o canto, aumenta-se a capacidade
pulmonar. A técnica é a de cantar em voz alta, selecionando
músicas e tonalidades adequadas a cada voz. O método
também incentiva o acompanhamento do ritmo do canto com
as mãos, chocalhos e percussões.
A musicoterapia
no método Akaboshi é ativa, porque os participantes
tocam, movimentam o corpo e treinam a vocalização.
O trabalho é feito em grupo, o que estimula a consciência
do outro e a socialização na infância. Na
relação com pessoas idosas, é buscado o resgate
da memória com músicas nostálgicas.
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