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Arquivo Edição 254 - 21 a 27 de abril de 2004 - Especial - Portal NippoBrasil
 
O sedentarismo é o inimigo número 1 da saúde pública
Quem diz isso é o médico esportista Victor Matsudo, criador do programa Agita São Paulo, que surgiu no ano de 1996


PROFISSÃO - Victor Matsudo sonhava em ser jogador de futebol, mas já vai para sétima Olimpíada como médico da delegação brasileira

 

Arquivo Jornal Nippo-Brasil

Combater o sedentarismo com 30 minutos diários de atividade física moderada. Essa é a proposta do Agita São Paulo, programa criado em 1996 a partir de uma parceria entre a Secretaria de Estado da Saúde e o Centro de Estudos do Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul (Celafiscs). Reconhecida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como modelo de promoção da saúde - fato que culminou com a criação do Dia Mundial da Atividade Física, comemorado anualmente em 6 de abril -, a idéia teve como mentor o médico Victor Keihan Rodrigues Matsudo, 55, presidente do Celafiscs e atual coordenador geral do Agita São Paulo.

Filho do okinawano Keizen Matsudo e da brasileira Albertina Rodrigues Matsudo, o paulistano Victor sempre se interessou por esporte. Não fosse a intervenção paterna em sua adolescência, teria deixado São Caetano - para onde mudou-se com a família aos dois anos - atrás de promessas de um olheiro, que dizia querer transformá-lo em craque do futebol do Palmeiras. “Meu sonho era praticar futebol para ir para uma Olimpíada”, confessa.

Coincidência ou não, sua pretensão concretizou-se anos depois. Não como atleta, mas como médico formado pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, especialista em ortopedia, traumatologia e medicina do esporte, profissão que o levará em agosto à Grécia, à sua sétima edição de Jogos Olímpicos. “No final, tenho de agradecer a meu pai, porque se jogasse bola talvez nunca teria ido para uma Olimpíada”, brinca.

Casado com Sandra Marcela Maecha Matsudo - diretora geral do Celafiscs e assessora do Agita São Paulo - e pai de Flávia Kei Matsudo, Victor Keihan acumula diversos cargos em instituições especializadas em medicina esportiva. Entre eles, destacam-se os de diretor regional do Conselho Internacional de Ciências do Esporte e Educação Física (ICSSPE) - órgão da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) -; consultor do Grupo Internacional de Atividade Física para Saúde, da OMS; e membro da Comissão de Detecção de Talentos do Comitê Olímpico Internacional (COI).

Em 31 anos de carreira, o nikkei, que também é editor de revistas nacionais e internacionais sobre prática esportiva e saúde e professor livre docente em Medicina na Universidade Gama Filho (RJ), já trabalhou com grandes nomes do esporte nacional, como Magic Paula, Hortência e Oscar Schmidt, ícones do basquete brasileiro. Modalidade da qual, aliás, foi médico da seleção brasileira em 1976. Isso sem falar de William, Xandó, Montanaro e Amauri, jogadores da “geração de prata” do vôlei - vice-campeã mundial e olímpica em 82 e 84, respectivamente - que passaram pelas mãos de Victor Matsudo ainda adolescentes.

O reconhecimento pelas horas empreendidas em prol da saúde pelo esporte renderam-lhe o Grande Prêmio Internacional de Medicina Esportiva dos Jogos Olímpicos de Barcelona, em 92; o Prêmio de Pesquisa Philip Noël Baker em medicina esportiva, concedido pelo Conselho Internacional de Ciências do Esporte e Educação Física, em 95; e o prêmio do Príncipe Faisal da Federação Internacional de Educação Física (FIEP), em 96.

No embate contra aquele que ele considera o inimigo número um de saúde pública, Matsudo e sua equipe, ao lado do governo do Estado e mais de 300 empresas parceiras do Agita São Paulo, contribuíram para a redução de 70% para 50% no índice de sedentarismo entre os paulistas em oito anos de programa. E, segundo o especialista, mesmo quem só conhece a mensagem do Agita tem chances 50% menores de se manter sedentário que alguém que não sabe sobre sua existência. “É uma das melhores metas já alcançadas por qualquer programa do gênero”, proclama. “Mas ainda falta muita coisa. Temos que transformar nosso País naquilo que sonhamos e criarmos um instrumento de mobilização social”, defende.

Comprometido desde os tempos de universitário com a construção da saúde, Victor descobriu no esporte uma alternativa barata e acessível para a prevenão de doenças e promoção de uma vida mais equilibrada. “Por isso é que comecei a estudar e verificar até que ponto essa atividade física poderia trazer benefícios concretos para a saúde”, diz o médico, ao comentar sobre os anos que antecederam a criação do Agita São Paulo.

 
Acompanhe os principais trechos da entrevista que Victor Matsudo concedeu ao NB


SAÚDE - Matsudo diz que sedentarismo é um problema social que no início da década de 90 comprometia 70% da população da Grande SP

NB: Quais fatores que o levaram a se preocupar com o sedentarismo?
Victor Matsudo:
O sedentarismo é um problema social que no início da década de 90 comprometia 70% da população da Grande São Paulo. Ainda hoje, trata-se do mais prevalente de todos os problemas e o inimigo de saúde pública número um. Ele leva a 300 mil mortes cardiovasculares por ano no Brasil. E, igualmente ruim, o sedentarismo custa dinheiro. Juntamente com má nutrição e o cigarro, consome 70% do orçamento de saúde do País, das Américas e do mundo. Todos esse fatores nos levaram a começar a trabalhar na construção de um modelo para combatê-lo. Assim, em 96, o então secretário de Estado da Saúde, o Dr. José da Silva Guedes, se empolgou com os trabalhos que fazíamos em São Caetano. Ele veio a mim e perguntou se o Celafiscs aceitava o desafio de criar um programa para promover saúde e combater o sedentarismo. Foi assim que nasceu o Agita São Paulo.

NB: E qual é a proposta do programa?
VM:
É a famosa mensagem do acumular os 30 minutos. Essa mensagem foi muito estudada, não só pelo Celafisics, mas por diversos pesquisadores do mundo. Em 95, diversos grupos de cientistas se uniram e descobriram qual era o mínimo [de atividade física] que você tinha de fazer. E esse mínimo são pelo menos 30 minutos. Com 30 minutos você começa a diminuir [as chances de] derrame, infarte, tudo. Começamos então a mostrar que era o estilo de vida que precisávamos dar, e não dar mais médicos. Falar em atividade moderada, ou seja, aquela que você faz e consegue conversar, e exercícios não-contínuos, que poderiam ser feitos em 30 minutos de uma vez ou em três bloquinhos de 10 [minutos], também foi outra mágica. Assim, em 10 minutos você caminha, em 10 dança e em 10 jardina. Por isso, pode-se dizer que o Agita criou um novo conceito e rompeu com todos os paradigmas.

NB: Qual o segredo para se combater o sedentarismo?
VM:
O mais importante é que você busque algo que dê prazer e seja viável. Tente você montar sua agenda e criar metas para que possa competir consigo mesmo. Outra dica é ter uma companhia para a prática esportiva. Porém, caso não a tenha, abra um diálogo com você. Crie aquele momento que precisava para fazer um balanço, uma proposta. Agora, o que não se pode é criar barreiras.

NB: Quais outras recomendações que o senhor daria para uma vida mais saudável?
VM:
Duas coisas que precisamos lembrar: alimentação saudável e manejo do estresse. De nada adianta fazer atividade física e detonar na alimentação. Assim como cuidar da saúde mental, numa socidade estressada e enloquecida, é fundamental. Se você conseguir fazer um estímulo físico, um estímulo alimentar e um estímulo mental adequado, certamente terá muita vantagem.

NB: Na sua opinião, o brasileiro é preguiçoso? E o japonês?
VM:
O brasileiro não é mais preguiçoso que um japonês. Não existe isso! Trata-se de uma idéia inadequada. Inclusive, quem já foi ao Japão sabe quanto que japonês gosta de dormir e ficar parado. Na verdade, o brasileiro é mais indisciplinado, mais desorganizado. O que fazemos é de forma ineficaz, porque não fazemos dentro de protolocos de eficácia. Temos uma péssima gestão do tempo. Acabamos ficando mais tempo no trabalho, produzindo menos e, com isso, reclamando mais. Na minha opinião, o que existe é falta de estimulação. Mostre a um brasileiro o que é bom no Japão ou mostre a um japonês o que é bom no Brasil e vamos usar.

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